Por INÊS NADAIS, Sandra Silva Costa e Sofia Rodrigues
JornaL PÚBLICO – Sábado, 29 de Novembro de 2003
O ministro da Segurança Social e do Trabalho, Bagão Felix, não reuniu, durante este ano, o Conselho Nacional para a Reabilitação e Integração de Pessoas com Deficiência, o órgão consultivo sobre as políticas nesta área. Esta é uma das críticas que a Confederação Nacional dos Organismos de Deficientes (CNOD)aponta quando instada a fazer o balanço do Ano Europeu das Pessoas com Deficiência.
“Foi mais uma feira de vaidades, mas que não se traduziu em nada na prática”, afirmou ao PÚBLICO o presidente da CNOD, Henrique Mendonça, exemplificando a falta de atenção do Governo para o assunto com o desprezo pelo Conselho Nacional para a Reabilitação.
O órgão de consulta do ministro da Segurança Social deveria reunir uma vez por trimestre, mas este ano não aconteceu nenhum plenário. Criado em 1997, este organismo é composto por representantes governamentais, de associações de deficientes, de organizações sindicais e do patronato, da Confederação Nacional das Associações de Família, entre outras entidades. Pode emitir recomendações e pareceres sobre medidas, programas e projectos relacionados com as pessoas com deficiência.
Segundo Henrique Mendonça, houve uma convocação para uma reunião mas, como foi feita irregularmente, não produziu efeitos práticos. O assunto era precisamente a proposta de lei de bases da deficiência, aprovada quinta-feira em Conselho de Ministros, e que prevê a criação de quotas obrigatórias de dois por cento de pessoas com deficiência nas empresas.
“Foram dadas 72 horas para as organizações se pronunciarem sobre uma lei em que o Governo esteve a trabalhar durante meses”, lamenta o presidente da CNOD, que representa 29 associações e mais de 100 mil deficientes. “O Governo esqueceu-se de nós e veio aprovar uma lei em que elas não foram ouvidas, conforme mandam as declarações internacionais”, afirma.
Ontem, à margem da gala que encerrou o Ano Europeu das Pessoas com Deficiência, que se realizou na Exponor, em Matosinhos, Bagão Félix respondeu a esta crítica. “As associações foram ouvidas durante mais de dois meses sobre os grandes princípios que enformam a lei. Na semana passada, o Conselho Nacional de Reabilitação deu o seu parecer sobre esta proposta de lei, e até foram feitas algumas alterações. E é preciso não esquecer que esta é uma proposta de lei, que vai agora para a Assembleia da República e depois estará sujeita a um período de discussão pública”, explicou ao PÚBLICO.
O presidente da ACAPO – Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal, José Arruda, confirma que a reunião foi marcada “em cima da hora”, mas que o facto de não ser válida fez com que se perdesse uma oportunidade de debate. Reconhece que deveria haver uma discussão “mais profunda” sobre a lei de bases da deficiência, mas diz que a ACAPO vai procurar acompanhar e contribuir para o debate que se realizará na Assembleia da República. “A lei não é tudo, mas é um passo importante”.
“Podia-se ter feito mais”
Em relação ao Ano Europeu das Pessoas Com Deficiência, Henrique Mendonça considera que a iniciativa foi uma “farsa”, dado que as centenas de iniciativas que muitas organizações já faziam aparecem este ano com o rótulo da efeméride. Em suma, o presidente do CNOD considera que a iniciativa teve pouco eco no dia-a-dia. “O mundo do cidadão não teve consciência de que 2003 era o Ano Europeu das Pessoas comddeficiência”, conclui.
Mais optimista está José Arruda, que faz um balanço positivo do Ano Europeu, por permitir abrir uma janela para o assunto. “Reconheço que há sensibilidade do Governo, apesar de ainda existirem muitos problemas para resolver”.
Bagão Félix também diz que o balanço “é positivo”A/I>, mas admite que há sempre “um sentimento de que se podia ter feito mais”. “O que é preciso é que as acções, as mensagens e as medidas que tomámos sejam agora enraizadas na consciência colectiva dos portugueses”afirmou.
O ministro lembrou que foram várias as medidas tomadas pelo Governo no âmbito da promoção da qualidade de vida dos deficientes, que se estimam em cerca de um milhão em Portugal. A saber: a Lei de Bases do Desporto, sublinha Bagão, “passou a considerar o desporto de alta competição dos deficientes”; no Código do Trabalho, foram “aumentadas as condições de protecção das pessoas com deficiência ou com capacidade reduzida para o trabalho”; e a Lei de Bases da Segurança Social, remata o ministro, criou “uma nova figura, a incapacidade absoluta e definitiva para o trabalho, que é uma figura diferente da invalidez”.